Entenda o que está acontecendo com a Gol
Empresa aérea perdeu mais da metade do valor de mercado desde 25 de janeiro.
Na tarde de quinta-feira, 25, a companhia aérea divulgou que protocolou uma solicitação ao Tribunal de Falências do Distrito Sul de Nova York, que é equivalente ao pedido de recuperação judicial no Brasil, optando pelo Chapter 11 nos Estados Unidos.
O Chapter 11, parte da legislação dos Estados Unidos, oferece às corporações a oportunidade de angariar fundos, reorganizar suas obrigações financeiras e continuar suas atividades sem interrupções. Em 2020, a concorrente Latam recorreu a essa proteção para se blindar contra exigências de credores, finalizando o processo com sucesso em 2022.
A Gol comunicou que recorrerá ao Chapter 11 com o objetivo de reorganizar suas dívidas de curto prazo e melhorar sua base de capital, visando a estabilidade a longo prazo. A empresa antecipa que, ao finalizar esse procedimento, contará com um aporte considerável de recursos, incluindo um novo financiamento DIP de US$ 950 milhões, o que a colocará em uma posição favorável para ampliar sua liderança na América Latina, conforme declarado.
A empresa expressou sua intenção de manter as operações sem alterações, embora reconheça que a atual crise pode provocar repercussões que se estendem desde a redução na procura por parte de passageiros preocupados com a segurança dos voos até possíveis desafios na oferta, em meio a eventuais disputas com empresas de leasing de aeronaves.
A Gol enfrenta restrições para expandir organicamente sua oferta de voos, visto que tal movimento demandaria investimentos significativos em retirar aeronaves de operação. A empresa reconhece que, ao avaliar o seu balanço atual, considerando os níveis de liquidez corrente e alavancagem, há uma necessidade premente de a companhia buscar uma maior eficiência operacional. Isso implica em cautela diante dos desafios financeiros associados ao aumento da capacidade, destacando a importância de uma gestão financeira cuidadosa no atual contexto.
O cenário que a empresa aérea se desenha em um contexto distinto em comparação ao da Latam. Esta fase representa uma oportunidade para a Gol reajustar suas operações, abrindo caminho para uma potencial retomada. Contudo, é essencial notar que o ambiente atual difere significativamente daquele durante a pandemia. A empresa enfrenta desafios e oportunidades em um panorama renovado, demandando uma abordagem adaptativa para se posicionar de maneira eficaz diante das circunstâncias atuais.
O Chapter 11 revela bastante sobre o panorama da aviação no Brasil. O governo em si reconhece as dificuldades enfrentadas pelas companhias aéreas. O setor se depara com regulamentações rigorosas, em um mercado caracterizado por custos elevados de combustível e uma abundância de litígios judiciais relacionados a passageiros. A complexidade se acentua ainda mais devido a despesas expressivas em dólar, enquanto a receita é gerada em real. A equação resultante apresenta desafios consideráveis, exigindo uma abordagem estratégica para enfrentar as complexidades financeiras inerentes ao setor.
O BNDES tem dedicado meses ao estudo da possibilidade de disponibilizar uma linha de capital de giro para as empresas, contudo, tem enfrentado obstáculos relacionados às garantias. As companhias aéreas, em um esforço para viabilizar essa oferta, tentaram a ideia de utilizar slots (espaços em aeroportos) e aeronaves em leasing como ativos garantidores nos empréstimos do banco. No entanto, essa proposta não avançou, indicando a complexidade e as dificuldades envolvidas na busca por soluções financeiras para o setor.
Atualmente, o governo está em processo de avaliação para determinar a viabilidade de utilizar o Fundo Nacional de Aviação Civil (Fnac), alimentado por taxas aeroportuárias, como um mecanismo garantidor. Essa proposta é semelhante ao papel desempenhado atualmente pelo Fundo Garantidor de Operações (FGO) no contexto do refinanciamento de dívidas de pessoas físicas do programa Desenrola. Essa análise destaca a busca por alternativas e soluções inovadoras para enfrentar os desafios financeiros no setor de aviação, utilizando recursos específicos para respaldar operações e promover a estabilidade econômica no segmento.
Dessa maneira, a proposta envolve que o BNDES disponibilize crédito com a garantia de reembolso por meio do Fundo Nacional de Aviação Civil (Fnac) em caso de inadimplência. No entanto, surge um desafio significativo, uma vez que o Fnac é um fundo meramente contábil, carente de recursos financeiros diretos, ao contrário do Fundo Garantidor de Operações (FGO). Devido a essa característica, a análise está sendo conduzida pelo Ministério da Fazenda.
A complexidade reside no fato de que, caso seja necessário realizar desembolsos para cobrir situações de inadimplência, haverá custos associados ao Tesouro, assemelhando-se ao modelo do Fundo Garantidor de Exportações (FGE). Essa avaliação destaca a importância de equacionar cuidadosamente as implicações financeiras e buscar soluções que equilibrem a necessidade de apoio ao setor de aviação com a responsabilidade fiscal do governo.
As ações da Gol (GOLL4) enfrentaram uma despedida desafiadora do Ibovespa durante a sessão da última terça-feira (30), marcada pelo pedido de recuperação judicial nos Estados Unidos, resultando em uma queda acumulada de 68% somente no mês de janeiro.
Na sessão específica de 30 de janeiro, as ações da Gol encerraram com uma expressiva queda de 26,97%, atingindo o valor de R$ 2,87, resultando em um valor de mercado de R$ 1,2 bilhão. Essa queda seguiu uma redução de 33,61% no dia anterior. As perdas acumuladas pela companhia aérea atingiram R$ 2,55 bilhões no ano de 2024 até 30 de janeiro, com uma desvalorização adicional de R$ 444 milhões apenas no último dia.
Desde o pedido de recuperação judicial nos EUA (Chapter 11) feito pela Gol na última quinta-feira (25), as ações experimentaram uma queda de 56,84%. Essa redução, especialmente acentuada nas últimas duas sessões, reflete as especulações em torno das implicações para os acionistas durante o processo e a decisão da B3 de excluir os papéis da aérea de todos os seus índices.
Diante da agravante situação, a Moody's anunciou em um comunicado nesta quarta-feira, 31, que rebaixou o rating da Gol Linhas Aéreas Inteligentes (GOLL4) de Caa2 para Ca, mantendo uma perspectiva negativa. Em seu pronunciamento, a agência destacou que, como resultado das medidas adotadas hoje, os ratings da Gol, Gol Equity Finance, Gol Finance e Gol Finance (LuxCO) serão em breve retirados. Isso ocorre em decorrência do fato de a empresa ter ingressado com um pedido de recuperação judicial ("chapter 11") nos Estados Unidos.
A Moody's enfatizou que a decisão da Gol nos EUA é um desdobramento da exaustão de recursos financeiros e da elevada alavancagem da empresa, proveniente de taxas de juros elevadas, aeronaves Boeing MAX em solo e dos impactos da pandemia. Esses fatores levaram a uma fragilização do perfil de liquidez e a uma estrutura de capital considerada "insustentável".
Em síntese, os desafios enfrentados pelo setor de aviação no Brasil, notadamente evidenciados pelos obstáculos financeiros das companhias aéreas, suscitam a busca incessante por soluções inovadoras. A análise das propostas, como a utilização do Fundo Nacional de Aviação Civil (Fnac) como garantia de crédito pelo BNDES, revela a complexidade de encontrar um equilíbrio entre a necessidade de apoio financeiro e a realidade de fundos contábeis sem recursos imediatos.
A interseção entre regulamentações rígidas, desafios cambiais e a busca por garantias financeiras reflete um cenário onde as empresas aéreas buscam adaptação diante de um ambiente em constante transformação. Nesse contexto, a análise conduzida pelo Ministério da Fazenda ressalta a importância de ponderar cuidadosamente os impactos fiscais e financeiros de iniciativas propostas, visando encontrar soluções sustentáveis para impulsionar a retomada do setor aéreo brasileiro. A busca por eficiência operacional, inovação financeira e aprimoramento das políticas setoriais emergem como elementos-chave para promover a resiliência e o crescimento sustentável da aviação no país.
Fontes: Bloomberg Línea / Estadão / InfoMoney.
*Pedro Moraes é colunista do Money Now News e faz a cobertura de macroeconomia na TS Research.
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